Mas calma. Não vamos começar essa conversa ansiosos desse jeito.
Deixa eu explicar isso direito.
A primeira vez que falei pro Renan que poderíamos casar fora do país, sugeri Las Vegas e ele ficou bravo. Não adiantou nada dar a carteirada jurídica e dizer que o ato era válido em qualquer lugar do mundo que ele não quis nem saber. Onde já se viu, disse, casar num lugar assim? Ninguém vai levar esse casamento a sério! Uma coisa que vocês precisam saber sobre Renan: ele leva o casamento muito a sério.
Então, porque quando um não quer dois não casam, ficamos um tempo vendo alguns lugares aqui em Curitiba enquanto tentávamos a sorte num concurso que prometia uma festa de casamento no Rio pro melhor vídeo. Outra coisa que vocês precisam saber sobre Renan: ele tem essa coisa com concursos. O vestido que usei no casamento e nossas primeiras alianças ele ganhou num concurso cultural de uma revista de noivas quando a gente nem era noivo ainda.
Algumas coisas emperraram nossos planos: a gente não tinha o dinheiro necessário pra casar (continuamos não tendo), nossa lista de convidados era muito extensa e difícil de reduzir (a de quem não é, né não?), tínhamos acabado de financiar um apartamento, estávamos fazendo reforma e colocando móveis na casa (quem casa quer casa), alguns convites de uma parte da família poderiam embolar uma outra parte dela (sabe essas confusões todas, né? Claro que sabe). Estava tão difícil chegar a um denominador comum que a gente já estava cogitando nem fazer casamento nenhum (na verdade, era só eu mesmo, porque, né? Renan leva o casamento muito a sério).
Não lembro direito como surgiu essa ideia, mas sei que um dia ele veio com essa. A Disney tem uns pacotes de casamento, namorada, vamos olhar? Tô pensando que pode ser uma boa. Mais uma coisa que vocês precisam saber sobre Renan: como bom sagitariano, quando ele diz tô pensando em ele quer dizer que na verdade já se decidiu e tá só comunicando isso ao seu interlocutor.
Eu sou uma pessoa absolutamente programada para enxergar só o pior cenário em qualquer coisa. Os piores, no plural, porque sempre são vários, catastróficos e pós-apocalípticos. Renan é basicamente meu oposto – e muitos fundamentam aí o sucesso do nosso relacionamento. Desde o momento em que decidimos que iríamos casar na Disney, eu sempre argumentei que seria impossível casar na Disney, terminar o apartamento e fazer a mudança no mesmo ano. Era, sob qualquer prisma de análise – econômica, social, política ou antropológica – inviável.
Renan, então, montou uma força-tarefa pra me convencer do contrário. Planilhas, planos de contenção de gastos, argumentos que fariam inveja a qualquer jurista eloquente de como aquela viagem seria a única oportunidade de nossos pais conhecerem um lugar tão maravilhoso quanto a Disney. Pra quaisquer problemas que você possa pensar – e saiba, eu pensei em todos eles e alguns mais – o homem achava resposta. Uma equipe funciona melhor quando tem um pessimista e um otimista (que gosta de vencer pela insistência) nela. Muitos fundamentam aí o sucesso do nosso relacionamento.
Vencida essa etapa, começamos a planejar efetivamente o casamento aqui no mundo real. Escolhemos o pacote básico, que permitia uma cerimônia simples e rápida para os noivos e mais dezoito convidados em um dos resorts da Disney. Sim, poderíamos incluir personagens, carruagem de Cinderela, outros músicos além do violinista de série e uma sessão de fotos no Magic Kingdom, bastando que tivéssemos dólares para tanto, o que, claro, não era o caso.
Renan é, como vocês já devem desconfiar a essa altura, do marketing, essa área que até hoje não consigo compreender bem, mas pela qual nutro a mais profunda inveja. Há uma coisa de belo na forma como as pessoas da comunicação veem o mundo. Ele ficou responsável por layouts de convite, envelopes, paleta de cores da cerimônia e essas coisas com as quais eu não tenho a menor habilidade pra lidar.
Eu tinha algumas exigências, contudo: queria usar sapato laranja, queria ouvir, caminhando pro “altar”, a música She (Elvis Costello) e ter a primeira dança ao som da música tema de Harry Potter. Queria uma foto ao melhor estilo excursão-pra-Disney com todos os convidados no castelo do Magic Kingdom. Queria uma programação bem linda pros nossos convidados sempre saberem onde estaríamos o tempo todo e pra que ninguém ficasse perdido. Foi tudo atendido, com requintes de crueldade de tão impecável, pelo planner. Muitos fundamentam aí o sucesso do nosso relacionamento.
Casamento na Disney para dezoito convidados. Tínhamos alguns problemas aí, evidentemente. Mas eles foram resolvidos da forma mais sincera possível: vamos convidar você para nosso casamento. É uma festa por adesão, você paga sua passagem, seu hotel e suas despesas de viagem, mas vai compartilhar com a gente, em outro hemisfério, o momento mais importante da nossa vida. Não precisa, é claro, se incomodar com presentes, nada disso. Pense em férias que você vai tirar e, no meio delas, vai num casamento. Vai ser rápido e indolor, toma o final da tarde e o começo da noite de um dia da sua viagem. Considere isso e avise se poderá ir, são só dezoito convidados. Vamos continuar amigos independente do que você decidir.
Temos mais que dezoito amigos, é claro, mas no final das contas, conseguimos o número exato de pessoas para embarcar nessa loucura com a gente. Meus pais, minhas duas irmãs, seus maridos e seus filhos. A mãe e a irmã do Renan. Meus padrinhos e uma grande amiga da minha família, além de cinco amigos nossos. Algumas ausências foram bem sentidas, é claro. Meu irmão e minha cunhada e o irmão do Renan não puderam comparecer. Alguns dos nossos melhores amigos também não estavam lá. Mas saiba, do fundo do coração: não tem casamento perfeito, mesmo quando tem casamento perfeito.
Foi uma grande loucura, sabe? Planejar um casamento de outro país. Conversar com o cerimonial sem nunca ter encontrado essa pessoa na vida. Conhecer o fotógrafo no dia do evento. Só ver o celebrante pelo youtube. Levar um vestido de noiva na bagagem. Organizar uma cerimônia em inglês para pessoas, como meus pais e minha sogra, que não falavam uma palavra na língua.
Tentamos cobrir todas as bases. Trocamos e-mails verdadeiramente histéricos com Danny, nosso cerimonial. Fizemos uma cartilha com todo o roteiro da cerimônia – palavra por palavra – traduzido pra todos os convidados. Fizemos nossos próprios votos, escolhemos músicas, confeccionamos camisetas temáticas pra todos, indicamos a paleta de cor do casamento. Presenteamos todos os meninos com gravatas amarelas e deixamos aberta – a todos – a possibilidade de comparecer à festa de all star, como o noivo. Compramos balões de ar temáticos para decorar o local.
O celebrante que escolhemos exigia que já fossemos casados ou que a gente se casasse na Flórida para realizar a cerimônia. Optamos pela experiência completa e saímos daqui solteiros para casar num cartório nos arredores de Orlando, portando apenas nossos passaportes e pagando uma taxa de 99 dólares. Tudo muito rápido e com um toque de linha de produção. Na certidão de casamento que nós mesmos preenchemos à mão tinha um campo pra indicar qual era o número do casamento em questão. Casar em outra cultura pode revelar uma imensidão de coisas sobre ela. E sobre você, também. Casar, por si só, acho eu, pode fazer isso.
Nunca quis ser princesa. Nunca planejei uma festa de casamento antes de precisar planejar a minha. Nunca tive esse sonho-de-casar. Nunca pensei sobre meu vestido de noiva. Quando eu e Renan começamos a namorar, eu sabia que a gente ia ficar junto, sabe? É uma dessas coisas que você só sabe. Mas eu nunca tinha vinculado essa certeza ao casamento como a gente costuma pensar nele. Não sou uma pessoa descoladona, não, mas não posso dizer que alimentei expectativas que não alimentei sobre o casamento pra contar essa história.
Só que quando penso nessa experiência – de casar com Renan na Disney – não consigo imaginar outra descrição que não envolva magia. Porque deu tudo tão certo que não tem como não ter sido mágico. Eu costumo ver a vida de uma forma muito cinza na maior parte do tempo. Costumo, também, dizer que a maioria dos dias são apenas regulares, só bons, e é isso que faz dos dias incríveis tão incríveis. Mas dei a sorte de encontrar alguém que é capaz de colorir a vida pra mim. De me mostrar que é possível ter dia incrível atrás de dia incrível sem deixar de acha-los incríveis. Alguém que pode transformar qualquer tarde cinzenta em Curitiba num por do sol maravilhoso de outono em Orlando.
Quanto foi?
Pagamos, pelo pacote mais simples – dezoito convidados, um bolo e quatro garrafas de espumante sem álcool (poderiam ser duas espumante alcoólico, optamos pelo sem álcool por causa das crianças), uma hora de cerimônia, duas horas de fotógrafo, três horas e meia de limusine e um álbum com vinte fotos – cinco mil dólares (na época, dois pra um).
Chamamos nossos convidados pra jantar no Olive Garden, no mesmo molde do convite ao casamento: cada um paga o seu. Lá, um jantar daora saiu, mais ou menos, 60 dólares por casal.
Burocracias:
Casar nos Estados Unidos, como qualquer coisa nos Estados Unidos, depende da legislação de cada estado. É muito fácil no Nevada e muito complicado na Califórnia, por exemplo. Na Flórida, há uma regulamentação bem simples para estrangeiros. Envolve ir ao cartório, apresentar passaportes, pagar a taxa e casar, preenchendo de próprio punho a certidão.
Vale saber:
Você pode casar em qualquer lugar do mundo que esse ato vai ser válido no planeta todo, desde que você tenha cumprido com a norma de casamento do local, como nós fizemos na Flórida. Isso tem até um nome bonito que você pode adotar no seu dia-a-dia: ato jurídico perfeito. Aquela certidão de lá vale aqui, sim senhor e sim senhora, embora tenha gente aí que insista em dizer que há necessidade de reconhecer em cartório o documento aqui, como se nossos cartórios fossem o suprassumo cartorário do planeta. Se você não quiser esquentar sua cabeça com essas burrocracias, no entanto, basta trazer sua certidão de casamento estrangeira e registrar o documento no 1º Ofício do seu domicílio. Ou casar aqui antes de casar fora, como tinha sugerido nosso celebrante gringo.
7 Comments
Sempre genial com as palavras, no enredo!!! Obrigada por nos deliciar com elas…histórias de vida e superação!!! Marta é a referência de todos nós em um monte de coisas da existência!!!!! Somos FÂS!!!
Eu não sabia que o casamento de lá valia aqui. Por alguma razão, sempre achei que era necessário validar, porque eu realmente não acho que os cartórios são o “suprassumo cartorário do planeta”, mas tenho a impressão que ELES acham que são.
Enfim, mais uma pequena viagem pela cabeça de Marta e Renan, uma narrativa que consigo visualizar bem a partir das suas palavras e posso dizer que, se tudo fosse um jogo e se todos os meus amigos estivessem alinhados em minha frente e eu precisasse adivinhar quem casou na Disney, vocês dois seriam mesmo a resposta que eu daria.
Lindo!
Aiiiiii Martinha matando a família de orgulho!!!! Sempre soube!!!amo!!! Amo Disney!!!
Melhor casamento, melhor texto, melhor casal. Famosinha da ermã. ❤️❤️
Martinha, sempre genial! Lembro o quanto fiquei feliz quando o Renan ganhou o vestido e alianças no concurso cultural e vcs ainda nao eram noivos. Foi demais! (Vamos morar no vestido! Hehehe)
Que casamento lindo! Amei de verdade <3
Conheço super pouco o Renan e a Marta, mas percebe-se de longe o carinho q um sente pelo outro.
Parabéns para vcs!!
Martaaaa!!!
Sabia do casamento na Disney, óbvio, tive que te cobrir por alguns bons dias, kkkk, mas não sei por que motivo não sabia nem metade da história. Adorei saber! Muito legal, agora, depois de tanto tempo, compreender a construção da ideia. Agora faz todo sentido. Na época foi meio assim: gente, que doidera é essa?!¿