Há algumas semanas, virei mestra. Renan será mestre no início do próximo mês.
E esse era o último lugar em que eu poderia imaginar falar desse mestrado, porque não é a proposta usar o espaço que tenho aqui para dar vazão ao relacionamento complicado e cheio de traumas que tenho com a academia – e já tem um caminhão de textão sobre isso lá no ansiosa.
Mas como eu e Renan encaramos juntos essa fase de calvário científico, o mestrado virou parte da nossa vida, entrou na nossa rotina e no nosso casamento. E quando decidimos que iríamos fazer isso ao mesmo tempo, não tínhamos como imaginar o quão difíceis seriam aqueles próximos dois anos.
Não há exatamente um consenso – nunca há – mas dizem que o mestrado é a fase mais tensa da vida de um pesquisador. Considerando minha experiência empírica, tendo a concordar com essa afirmação.
Eu sempre defendi a ideia de que o exercício acadêmico é um trabalho solitário. Você precisa se fechar nas suas leituras, nas suas reflexões e no seu universo de pensamentos para conseguir produzir. É da natureza do trabalho ser introspectivo, silencioso e feito em grupos de um.
E há toda uma vida da qual se precisa abrir mão em prol dos compromissos acadêmicos assumidos.
É um trabalho solitário, mas mais que isso: causa solidão. Parece que eu disse a mesma coisa, mas não. Causar solidão é um pouco mais complexo do que ser um exercício solitário.
Entre artigos, seminários, congressos e as intermináveis discussões que eu e Renan vivenciamos, não tivemos tempo de respirar. Mais de uma vez precisamos combinar horários e pautas para otimizar nosso pouco tempo, quase afogados na quantidade de coisas que cada um precisava dar conta antes do fim do próximo semestre.
No meio do caminho, largamos muitas práticas. Largamos hábitos, livros, seriados e até algumas pessoas. Nada disso foi realmente planejado. Quando você é mestrando, vai basicamente tentando fazer malabares com sua vida para encaixar tudo que precisa ser feito no pouco tempo que tem disponível para fazer. E pouca coisa sai ilesa desse processo.
E a maioria das pessoas que não compartilha a experiência e permanece na vida de um mestrando chega até o nível de conceder a ele o benefício da dúvida. As pessoas tentam te compreender, mas via de regra não conseguem vivenciar essa experiência da forma como você vivencia. É desolador. E solitário.
É por isso que quando eu e Renan decidimos que iríamos fazer mestrado ao mesmo tempo, não tínhamos como imaginar o quão fundamental seria essa decisão conjunta.
Porque por mais solitária que seja sua vida na academia, quando você tem a possibilidade de dividir, em casa, essas (nem tão) pequenas agonias, as coisas se tornam um pouco menos difíceis. Quando você pode chegar em casa e, na mesa do jantar, reclamar um pouco sobre como o orientador deixou de ler e/ou leu demais seu primeiro capítulo e encontrar, no seu ouvinte, um “eu sei, comigo também tá sendo assim”, as coisas se tornam um pouco menos difíceis.
E tornar as coisas um pouco menos difíceis é, talvez, um dos segredos de dividir a vida.
Eu e Renan somos de áreas muito diferentes e, em muitos momentos, não conseguimos compreender a pesquisa um do outro. Mas, apesar disso, conseguimos nos enxergar. Demos um ao outro um tipo de suporte que, sozinhos – como a academia quer que a gente se sinta –, não teríamos. Entendemos, juntos, o incomodo sentimento de solidão que dividíamos.
E, quando você divide a solidão, já não está mais sozinho.
Que sorte.
Leave A Reply