Tenho uma teoria sobre isso.
Essas são as cinco palavras que formam a minha frase favorita no mundo inteirinho.
Mas essa teoria da qual quero falar é bem minha. Embora eu já tenha essa ideia na cabeça há uns bons dez anos, antes desse texto falei dela no mundo real só duas vezes. Então acho que é válido dizer que vocês estão meio que vendo isso quase que em primeira mão.
Nessas duas vezes em que ela existiu fora da minha cabeça, eu estava envolvida em intensas argumentações favoráveis a mergulharmos de cabeça em chances. Eu acredito em chances. Em riscos.
A música que dá o tom aqui é Fidelity, uma canção de Regina Spektor lançada em 2006 e que ficou famosa lá em 2007/2008. Segundo fontes seguras (Wikipedia), foi trilha de seriados como Veronica Mars, Brothers & Sisters e Grey’s Anatomy, dos filmes Secret Diary of a Call Girl, 27 Dresses, Love & Other Drugs e da novela A Favorita. Conta a história de alguém que nunca amou outra pessoa completamente – I never loved nobody fully.
Mas o que me interessa mesmo – mais que a canção – é o clipe. E aqui cabe explicar que não sou uma pessoa muito de clipes (para profundo desespero de Renan, a pessoa que mais entende de música, clipes e billboard que eu conheço). Não cresci vendo MTV, não entendo a maioria esmagadora das referências desses vídeos e o YouTube acaba quase sempre me perdendo nos primeiros segundos. Minha atenção não fica presa no vídeo, é um defeito de fábrica.
Mas quando e eu ainda fazia algum esforço para tentar me enturmar com o pessoal que via clipes eu vi o dessa música. E ele falou comigo como nenhum outro falou.
A história do clipe – mais ou menos alinhada com a história da canção – é de uma menina que idealiza relacionamentos.
Acho que é válido partir da premissa de que todos nós, frutos do nosso tempo, idealizamos relacionamentos. Todo mundo quer o amor de novela, já até falamos sobre isso aqui uma vez. Todo mundo tem um painel só com o buraco do rosto, daqueles que têm naquelas lojas de estrada pra praia, sabe? Em que você só enfia a sua cara e a cara da outra pessoa num traje típico pra tirar uma foto constrangedora. Todo mundo tem esse molde de qual pessoa considera ideal e aí enfia a cara da pessoa real lá. Só que as pessoas reais não são moldes.
E a gente vai se machucar, eventualmente (essa é a palavra favorita– só que não – do Renan). Sim. Spoiler da vida: vai. Ninguém quer. Ninguém escolhe se magoar, ninguém gosta, ninguém acha legal. Mas acontece. É da vida. E a gente precisa viver com isso. Mais. A gente precisa arriscar, mesmo que saiba disso, mesmo que já tenha se machucado antes.
O que acho incrível desse vídeo é que ele fica a maior parte do tempo mostrando como é a vida daquela menina num relacionamento idealizado, com um pé no chão – always one foot on the ground. É tudo perfeito ali. As conversas são engraçadas, as ligações desliga-você-não-você-primeiro são ótimas, as fotos ficam boas, o pedido de casamento segue o roteiro. Tão perfeito que é esquisito. É preto e branco. E ela não tá triste, sabe? Não. Ela não tá.
Mas acho seguro dizer que ela também não tá feliz. Ela apenas tá lá. Existindo. É possível só existir. É até possível dizer que não tem nada de errado em querer a segurança do só existir. Se machucar, se magoar, tudo isso é cansativo, né? Demanda. E às vezes a gente não quer essa demanda, só quer pendurar o coração no pescoço, deixar ele lá, quieto. E tá tudo bem.
Mas quando a menina do vídeo se permite viver tudo, baixar a guarda e quebrar o colar de coração, as coisas mudam. Aquelas duas pessoas ali se transformam em duas pessoas de verdade. E passam a vivenciar uma confusão só, a casa fica uma bagunça, pó de tinta pra todo lado. Mas a vida ganha em tonalidade, em risos, em cor.
É claro que o ato de quebrar o coração pode ser literal, se magoar, como acontece com todo mundo. Mas também pode ser outra coisa, não tão literal assim. Pode ser quebrar-de-abrir.
Eu sempre preferi acreditar que era quebrar-de-abrir.
Sempre preferi acreditar que, quando aquela menina se permitiu parar de proteger tanto o coração que tava no pescoço com medo de, sei lá, passar por outra mágoa, ela também parou de se segurar. Parou de idealizar, parou de tentar evitar sofrer. Parou de só existir para – por mais piegas que soe – viver.
Eu sei que parece um pouco idiota. Romântico demais. Até um pouco idealizado, toda essa conversa que eu comecei tentando afastar. Sei que essa ideia é cheia de todavia, mas, porém. E eu sei que parece que só digo isso porque vivo, em casa, um relacionamento que vai bem.
E talvez não adiante dizer que eu pensei nisso antes de Renan. Mas foi. E talvez o fato de ter pensado em tudo isso antes me fez derrubar aquele painel idealizado que um dia eu tive. E talvez tenha me feito ver que, ainda que Renan não coubesse naquele painel (ninguém cabia, ninguém cabe, ninguém nunca vai caber), valia a pena arriscar quebrar-de-abrir o coração outra vez.
Até porque se esse coração acabar quebrando de quebrado, o que pode (eventualmente) acontecer – afinal, é da vida – pelo menos pudemos ver as cores.
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